terça-feira, 25 de junho de 2013

INTOLERÂNCIA DE CADA DIA




SEGUNDA-FEIRA: É cacimbo! Camponeses regressam ansiosos às margens húmidas do rio para a plantação de hortícolas. Nas cidades, para a surpresa de muitos, voltou à baila, e ocupando espaço editorial nos jornais, rádios e televisões o uso do antónimo da tolerância.
Existe ou não intolerância? Uns dizem que sim, outros dizem que não! E quando em debate, os representantes de várias cores político-partidárias procuram com sagacidade esgrimir os seus argumentos puxando as brasas para o seu carapau. Aos ouvidos arrebitados do público chegam as mais variadas verdades e inverdades sobre o tema. Cada um defende e persiste na sua dama, mesmo quando esta já vai em trajes menores. Na sequência, instala-se um ruído perigoso para o processo comunicacional entre os actores políticos, ambiente que pode afectar, de uma maneira ou de outra, o resto da sociedade. O diálogo pode virar monólogo.
Lamenta-se, mas a vida está cheia de contrariedades. Há opiniões com as quais não estamos de acordo, mas somos obrigados a aceitar, sob o risco de sermos taxados de intolerantes. E pelos visto ninguém gosta de ser considerado intolerante. Então, tente ser diferente. Tente ser uma pessoa melhor! Melhoral caiu em desuso. Depois da Aspirina, agora é Paracetamol que bate.
 A tolerância é semente e estrume. É assim que se constrói e perduram estáveis amizades, namoros, casamentos, relacionamentos, parcerias e projectos de sociedades.
Quem já nunca ouviu palavras semelhantes?
- Eu gosto muito dela e quero sempre estar do seu lado, porque ela me aceita tal como sou! Não vê as minhas opiniões, ainda que tenham alguma dose de disparate, como vindo de gente pueril. Ela procura generosamente entender, perceber. E sempre chegamos a conclusão que a diferença de opinião resulta do ponto. É uma questão de ponto de vista! Por isso, a instabilidade tem sempre no seu bojo um acto de intolerância.
A tolerância semeia-se e germina como alfobres de flores do campo. Mas o que é a tolerância e intolerância, quais as suas derivadas! De tanta confusão que o ruído provoca nas mentes, nada melhor que procurar o Dicionário Moderno da Língua Portuguesa, para saber o que de facto significa. E prontamente encontro: Condescendência, ou indulgência para com aquilo que não se quer ou não se pode impedir. Boa disposição dos que ouvem com paciência opiniões opostas às suas. Faculdade ou aptidão que o organismo dos doentes apresenta para suportar certos medicamentos.  
Então, paro, cogito e no mesmo dicionário, busco o termo intolerância. Esfolheio. Esfolheio e finalmente encontro. Intolerância quer dizer falta de tolerância. Violência.
Raciocino. Quem é intolerante? Pessoa que carece de tolerância. Que não suporta as crenças e as opiniões alheias, se divergem das suas.
Já mais satisfeito acesso a internet em http://pt.wikipedia.org: «tolerância, do latim tolerare (sustentar, suportar), é um termo que define o grau de aceitação diante de um elemento contrário a uma regra moralculturalcivil ou física. Do ponto de vista da sociedade, a tolerância é a capacidade de uma pessoa ou grupo social de aceitar outra pessoa ou grupo social, que tem uma atitude diferente das que são a norma no seu próprio grupo. Numa concepção moderna é também a atitude pessoal e comunitária de aceitar valores diferentes daqueles adoptados pelo grupo de pertença original.
O conceito de tolerância se aplica em diversos domínios:
- Tolerância social: atitude de uma pessoa ou de um grupo social diante daquilo que é diferente de seus valores morais ou de suas normas.
- Tolerância civil: discrepância entre a legislação, a sua aplicação e a impunidade.
- Tolerância segundo Locke : «parar de combater o que não se pode mudar».
- Tolerância religiosa: atitude respeitosa e convivial diante das confissões de fé diferentes da sua.
- Tolerância farmacológica ou medicamentosa: diminuição da responsividade a um fármaco, ou seja, a diminuição do efeito farmacológico com a administração repetida da substância.
- Tolerância técnica: margem de erro aceitável (ver Tolerância, engenharia), ou capacidade de resistência a uma força externa.
- Tolerância: em gestão de riscos constitui o nível de risco aceitável normalmente definido por critérios pré-estabelecidos.»

TERÇA-FEIRA: Volto a pesquisar sobre o assunto em http://pt.wikipedia.org/wiki/Intoler%C3%A2ncia «Intolerância é uma atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em reconhecer e respeitar diferenças em crenças e opiniões. Num sentido político e social, intolerância é a ausência de disposição para aceitar pessoas com pontos-de-vista diferentes. Como um constructo  social, isto está aberto a interpretação. Por exemplo, alguém pode definir intolerância como uma atitude expressa, negativa ou hostil, em relação às opiniões de outros, mesmo que nenhuma acção seja tomada para suprimir tais opiniões divergentes ou calar aqueles que as têm. Tolerância, por contraste, pode significar "discordar pacificamente". A emoção é um factor primário que diferencia intolerância de discordância respeitosa
A intolerância pode estar baseada no preconceito, podendo levar à discriminação. Formas comuns de intolerância incluem acções discriminatórias de controle social, como racismosexismo, homofobiaheterossexismoetaísmo  (discriminação por idade), intolerância religiosa e intolerância política. Todavia, não se limita a estas formas: alguém pode ser intolerante a quaisquer ideias de qualquer pessoa.
É motivo de controvérsia a legitimidade de um governo em aplicar a força para impedir aquilo que ele considera como incitamento ao ódio. Por exemplo, a Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos da América permite tais manifestações sem risco de acção criminal. Em países como AlemanhaFrançaPortugal e Brasil, as pessoas podem ser processadas por tal atitude. Esta é uma questão sobre quanta intolerância um governo deve aceitar e como ele decide o que constitui uma manifestação de intolerância.
Enquanto prossegue o debate sobre o que fazer com a intolerância alheia, algo que frequentemente ignora-se é como reconhecer e lidar com a nossa própria intolerância.»
QUARTA-FEIRA: Nas palavras, nos gestos e mímicas, quanta intolerância está presente no nosso dia-a-dia. Nos relacionamentos. Lá em casa. Quanta intolerância no trânsito engarrafado da cidade capital, que não raras vezes acaba em violência e morte. Quanta intolerância nos transportes públicos. Quanta intolerância nas salas de aulas. Quanta intolerância nos locais de trabalho, nos bancos das igrejas, nos hospitais, nos partidos políticos, nos parlamentos, nos mercados, em fim! Quanta intolerância habita ainda as nossas mentes! Reconhecer que esse mal existe seria um grande avanço no caminho da superação. MINHAS SENHORAS E MEUS SENHORES! Para a consolidação da paz e da reconciliação importa trabalharmos diariamente, procurando sermos mais tolerantes com o próximo. A palavra de ordem deve ser: Tolerância! Tolerância! Tolerância!
E porque não tornar a Tolerância disciplina obrigatória para todos os níveis de escolaridades?
QUINTA-FEIRA- APLAUSO! Desde o Soyo, o Projecto LNG fez a sua primeira entrega ao mercado internacional. É o coroar de vários anos de trabalho persistente de funcionários, engenheiros e técnicos. A todos eles a nossa merecida homenagem. As ofertas de gás no mercado nacional irão com certeza aumentar, para atender a crescente demanda.

SEXTA-FEIRA: 21 de Junho. «Deus se agrada bem de tais sacrifícios» Heb. 13:16.

SÁBADO: «Pastoreai o rebanho de Deus… aos vossos cuidados» 1 Ped. 5:2

DOMINGO: O olho-por-olho pode deixar os contendores cegos e o dente-por-dente desdentados. A era é outra. «Não vos esqueçais de fazer o bem» Heb. 13:16

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Espionagem arbitrária



SEGUNDA-FEIRA: São 4H00. Acordo sob o som da música do despertador. É “A Via Láctea” de Renato Russo!- Sempre existe uma luz/Quando tudo está perdido… 
Acordei, mas permaneço imóvel na cama morna, buscando na sinfonia o recobrar das forças e energias, o conectar da alma à vida com os seus devaneios. O esfolhear das lições anteriores na projecção de um novo dia, buscando transcendência na poesia de cada manhã com seus gorjeios arrebatadores. Cada pássaro o seu cantar e juntos formam a harmonia da orquestra matinal. E a água fria do chuveiro completa o milagre divino. O fornecimento da água e da luz estão normalizados. Cresce o optimismo. Antes de descer espreito através da cortina da sala a normalidade da cidade ainda adormecida.
Aperto cinto. Dou o arranque. Ligo o rádio. Enquanto aqueço o motor do carro, percorro mentalmente a totalidade do trajecto. Nas curvas, reduzo a velocidade e nos entroncamentos paro, olho e escuto. Preparo-me psicologicamente para suportar as arrelias provocadas pelo engarrafamento e seus protagonistas. Quantos litros de combustíveis são consumidos por veículos em pequenos trajectos. Quanto o país gasta com o trânsito parado? Milhões de dólares em combustíveis subvencionados pelos cofres do Estado, que serviriam para outras demandas das populações! Talvez desse para a criação de um subsídio de natalidade para acudir às populações de baixa renda: Durante e depois da gravidez, toda a mulher desempregada receberia no Banco um valor mensal até que o seu filho atingisse os 18 anos. Por exemplo, 10 mil kwanzas para quem hoje vive com menos de 100 kwanzas/dia seria uma grande fortuna. Seria uma das formas para atenuar os efeitos nefastos da pobreza nas famílias angolanos, elevando assim o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Inspiro e expiro sonhador. O engarrafamento no trânsito luandense também gera negócios, não só para as gasolineiras, mas também para os ardinas e outros vendedores ambulantes que encontram aí vitrina para os seus produtos. As Rádios são outras que facturam com os nervos dos automobilistas encurralados em estradas sem alternativas. O caos do trânsito faz emergir orgulho no Radialismo angolano, animando ou desanimando as manhãs com palavras e músicas de vários quadrantes. Entre a plateia estressada, ele encontra homens energúmenos, boçais, ignorantes talvez que lhe contrariem. Quem o contrariar pode ser taxado de invejoso… Mas responder ouvintes igualmente com insultos pode não ser a melhor escola! Ah, o Manual de Rádio Jornalismo Jovem Pan! Trate o ouvinte com delicadeza, ainda que este use linguagem pouco cortês. Avance irmão angolano. Como diz Nelson Rodrigues, “quem pensa com unanimidade não precisa de pensar”.

Sair do Lar do Patriota para a Corimba é uma verdadeira guerra de nervos. Outros buscam saída ou entrada na antiga estrada do Futungo de Belas. Mas aí encontram uma placa “ÁREA RESTRITA”, limitando a passagem. Apenas alguns poucos passam através do filtro fino do controlo militar. Logo o desassossego destoa da calma transmitida pelas manhãs de cacimbo. Perde-se muito tempo para se alcançar o Morro da Luz. É demasiado. Consulto as horas! São 6H30 e percebo, pela fila de carros, que até à baixa de Luanda gastaria mais de 3 horas. Preciso chegar antes, para conseguir um espaço para o estacionamento, pois a Marginal está em obras e não foram criadas alternativas. Não há alternativas! Que fazer? Entro em sofrimento. Depois da passagem superior do Morro da Luz retorno e apanho a estrada do lado da praia. Seguimos em coluna numa estrada cheia de buracos e solavancos. O cheiro do mar e de peixe deteriorado pairam na atmosfera. Náuseas! É preciso calma e muita paciência.  
Os autocarros públicos sumiram das estradas. Se alguém investisse em transportes colectivos de qualidade para os que moram no Kilamba, eu deixaria de investir em carro pessoal. Um autocarro VIP com toda a acomodação e prestação de serviço de bordo quem não pagaria? Cada passageiro obteria um cartão reservando a sua poltrona. Às 5H00, 5H30, 6H00 e 6H30 partiriam do Kilamba, regressando apenas no período da tarde. Ou seja, a partir das 15H30, 16H00, 17H00, 18H10. Era também uma forma de os socializar, pois andam muito ilhados.

TERÇA-FEIRA: A Polícia Nacional abre inscrição para novos candidatos. Um erro de cálculo, leva a suspensão de todo o processo horas depois de ter iniciado. O número de jovens candidatos que procuram pelo primeiro emprego, supera as expectativas das autoridades. A preparação minuciosa de qualquer processo é premissa de êxito. Valeu a correcção atempada do tiro! O improviso é inimigo da perfeição.

QUARTA-FEIRA: Exausto regresso a casa. Não tem jeito. Já no Kilamba, passo e não acredito no que vejo. Paro e recuo. Pestanejo. Me belisco. Continuo incrédulo. Repito o gesto com maior violência. E caio na real. Alguém ateou fogo ao relvado ressequido do Quarteirão A da Centralidade do Kilamba. Suspiro com desgosto e parto desiludido. O que é que essa gente tem na cabeça. E fico a pensar na minha infância! Já fui inocentemente feliz! Apesar das arrobas de café cereja e de milho que levava para a moagem, eu era uma criança feliz. Atenção: A arroba são 15 quilos, diferente da @ da Internet. Por iniciativa própria recolhia e partia coconote no palmar para comercializar na cantina do sô Manuel, recebendo em troca quedes-praia e lenço de bolso, rebuçados, amêndoas e bolachas. Mas nada de trocar a escola e as brincadeiras pelo trabalho. Lavar a loiça fazia parte do exercício de adestramento. Não era como as crianças que combatem de armas na mão em alguns países. 12 de Junho assinala-se o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil. A data começou a ser comemorada em 2002, por iniciativa da OIT (Organização Internacional do Trabalho), com o objectivo de chamar a atenção da sociedade e governos sobre a importância da implementação da Convenção que estabelece a idade mínima para admissão ao emprego.

QUINTA-FEIRA: O sistema bancário está lento. Com ranger de dentes, aguento a fila durante toda a manhã. As filhas no estrangeiro clamam. Tento acalma-las, justificando, mas a barriga não aceita as explicações: Pai, não queremos palavras. Queremos dinheiro da bolsa. Ok. Calo. No fim, também quero bons resultados.

SEXTA-FEIRA: O avanço das novas tecnologia propicia um rápido desenvolvimento das sociedades jamais vista em toda a sua história, todavia o seu uso indevido pode acabar por criar conflitos com a legalidade diante da exposição da privacidade alheia. É nesse âmbito que se inscreve o gesto inusitado do ex-agente da CIA Edward Snowden, de 28 anos de idade, denunciando o programa de espionagem em massa da Agência norte-americana. A tal democracia na América também funciona assim?!!! Então estamos entalados! Então, as inquietações de Jorge Orwell expressas na sua obra 1984 eram justas. Publicado em 8 de Junho de 1949, o romance narrada história de Winston Smith, um homem com uma vida aparentemente insignificante, que recebe a tarefa de perpetuar a propaganda do regime através da falsificação de documentos públicos. Smith fica cada vez mais desiludido com sua existência miserável e assim começa uma rebelião contra o sistema.
“Estou disposto a sacrificar tudo por não poder, em sã consciência, permitir que o governo norte-americano destrua a privacidade, a liberdade na Internet e a liberdade básica das pessoas em todo mundo com uma máquina de espionagem”, diz o ex-agente da CIA Edward Snowden.
O termo Big Brother, popularizado pelo romance, refere-se à fiscalização e controle de um determinado governo na vida dos cidadãos, além da crescente invasão sobre os direitos do indivíduo.
SÁBADO: Falando em espionagem, lembro-me de um episódio da minha infância. Muitas mulheres andavam inquietas devido aos rumores que perpassavam a aldeia descrevendo com minúcia as suas partes íntimas. Alguém estaria a monitora-las. Quem seria? Desconfiaram. Só pode ser um homem que se tenha escondido nas margens do rio Mazungue, para as espionar durante o banho. Foi assim que decidiram montar uma emboscada. Um grupo de senhoras entrou no rio e um outro permaneceu na Aldeia, aguardando o cair do sol. Quando o crepúsculo espalmava as sombras do arvoredo sobre a paisagem, nas margens, o grupo de patrulha seguiu um rasto. Devagarinho, caminharam até confirmarem as suas suspeitas. Ajoelhados, o homem perscrutava as senhoras através das folhagens. As mulheres gritaram. Surpreendido, jogou-se no rio desaparecendo na outra margem. Mas foi reconhecido. Era o guarda-redes da equipa do bairro. Foi assim, que no sábado, no Comité do bairro, todos os aldeões conheceram e puniram o espião da aldeia. Zé Liengue, apesar de analfabeto e mesmo sem TV, já conhecia os dois sabores do Big Brother!

DOMINGO: Desligo o telefone. Quero voltar a ser um homem livre!