quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Natal com palavras


No Natal, estamos em comunhão, mas é um dia incomum, porque rompe com o ciclo de rotinas moldadas no fazer da vida um lugar de vencer distâncias e derrubar obstáculos. É momento de pausa para um olhar desarmado, ainda que de soslaio, para o mundo que se estende além do ego de cada um.
Apreciar a beleza e o significado da obra que erguemos e as relações que estabelecemos e mantemos com a esposa, com os filhos, com os outros membros da família, com os colegas e amigos, com Deus e a Pátria!
Com certeza, para muitos, no fim, ao voltar o olhar para o horizonte, a retina guardará um tapete colorido de flores, cujo perfume agradará às redondezas. E outros, amaldiçoarão a sua sorte, quando se aperceberem que, a seus pés, das sementes germinaram apenas espinhos. Permanecerá todo o sentido da parábola segundo a qual quem semeia ventos colherá tempestades. E a festa que se fizer, ajustar-se-ia ao devido tamanho e à qualidade da colheita no fecho da safra. Se calhar, muitos teriam poucas razões para festejar.
Haverá outros, para quem as sementes não germinaram. Chorarão, mas a porta não se fechou! Não amaldiçoe nem culpabilize os demais. Reveja os seus próprios métodos e técnicas que usou no amanho da terra. Verificai a fertilidade do solo e a qualidade da semente!
O semeador sofrerá, chorará e suará, mas, se tudo for feito com amor resultará numa safra de muita fartura em paz e alegria. O amor brilha e é comum confundi-lo com o de muitos cascalhos que abundam na natureza. Muitos caíram em desgraça por o terem confundido.
Saúde, dinheiro, carros, felicidade. – “A felicidade, todos nós queremos”, cantou Sebem! A todos existe a chance de encontrá-la, mas ela pode estar por detrás de um simples gesto de amizade, de amor, de carinho, de camaradagem e de solidariedade.
E ontem, por razões que transcendem a imodéstia, foi um dia daqueles que ganham lugar cativo no arquivo da memória e coroam a vida com o sublime dos presentes.
- Ainda guardo uma foto daquele tempo antes da independência. Nela estou eu e outras crianças da minha idade. As crianças brancas, de que faço parte, estavam bem apresentadas e naturalmente sorridentes, enquanto as negras mal vestidas e tristes. Hoje, os meus olhos vêm coesas que não viam naquele tempo. Se naquela altura não fosse assim, o nosso futuro teria sido diferente!
Essas são palavras de um ex-estudante da Escola Primária nº66 Augusto Gil, na Gabela. Hoje, ele tem 46 anos e vive no Porto, Portugal.
Uma dessas crianças negras de que se refere, e que levavam banana cozida com dendém e lavavam os pés empoeirados pela marcha no riacho antes de entrar na cidade de asfalto, sou eu! E o meu Natal era diferente do dele, mas tinha presépio e menino Jesus!
Na conversa mantida através do MSN, ele contou a saudade que sente dos antigos colegas e amigos e de Angola. E ficámos remoendo nossas lembranças, costurando sob o frio do inverno os nossos sonhos num amanhã radiante, que enterre para sempre as tristezas que amargaram a vida!
Ao terminar, ele clicou num bolo e eu num presente! E ficou a promessa de vermo-nos em 2010, em Angola! Que Deus nos abençoe!

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